Mês passado fui a Toronto, no Canadá, para apresentar uma pesquisa recente que realizamos aqui na Universidade de Warwick. A conferência se chama Automotive UI, ou interfaces do usuário automotivo. Diversos pesquisadores de várias partes do mundo se juntaram por três dias para apresentar suas pesquisas e discutir tópicos diversos em oficinas. O trabalho que apresentei foi conduzido no meu grupo de pesquisa como parte do projeto chamado UK Autodrive. O título do trabalho, escrito e apresentado originalmente em inglês, pode ser traduzido como algo do tipo “Avaliando como as interfaces influenciam a interação do usuário com veículos totalmente autônomos”.
Com o aumento da automação veicular, ocupantes de veículos totalmente autônomos provavelmente vão ficar completamente desligados das tarefas relacionadas à direção. Os motoristas serão na verdade passageiros, já que o veículo terá todo o controle. É previsto que no futuro, veículos autônomos não terão pedais nem volante. Entretanto, mesmo sem estar envolvido com a direção, as pessoas inda necessitarão de interfaces entre o veículo e os passageiros. Existirão ainda atividades para serem realizadas em telas e displays.
O veículo usado nesta pesquisa, chamado de ‘pod’, é um meio de transporte de baixa velocidade para curtas distâncias, para ser usado em áreas onde pedestres andam, por exemplo em quarteirões fechados nos centros da cidades, em aeroportos, centros comerciais, parques, etc.
Este estudo avaliou combinações e configurações de telas diferentes, que forneceram aos ocupante algumas informações relacionadas à operação do veículo. Os passageiros puderam controlar o destino final do veículo, mudar o trajeto e parar o veículo, além de acompanhar o progresso da viagem e saber o tempo até o destino. Foram apresentados para os passageiros sistemas baseados num tablet fixado dentro do veículo com o mapa e os botões para se trocar o destino, parar o veículo, etc. Uma interface semelhante também foi apresentada num smartphone, já que usuários poderiam usar seus próprios telefones para controlar estes detalhes da viagem.
Questionários e entrevistas foram usados para medir a confiança, usabilidade, dificuldade e experiência depois que os usuários foram guados por um veículo totalmente autônomo.
Os resultados mostram que os participantes neste estudo ainda querem monitorar o estado do veículo e ver detalhes sobre a viagem, incluindo um mapa da rota e informações relacionadas. Observamos uma preferência para que o controle de aspectos da viagem fosse feito através do tablet, combinado com uma tela que fornecesse também informações gerais. O telefone não foi preferido para estas atividades por três motivos principais:
- Os usuários disseram que não queriam usar seus telefones pessoais por causa da ansiedade causada pelo receio de ficar sem bateria. Usar o celular com GPS sem estar sendo carregado consome muita bateria, e os participantes não queriam correr o risco de ficar sem bateria enquanto estivessem controlando um veículo. Talvez conseguissem carregar com um cabo no veículo, mas como se trata de um veículo de transporte semi público, fica um pouco mais complicado. E também, carregar o próprio telefone usando a bateria de um veículo elétrico vai apenas transferir o problema para o veículo, que também pode sofrer com pouca bateria. Usuários de carros elétricos sofrem do que é chamado ‘range anxiety’, quando ficam preocupados se a quantidade de carga restante na bateria vai ser suficiente para chegar até o destino ou até o ponto de carga mais próximo.
- Participantes também falaram que não gostariam de usar seus telefones pessoais porque eles são geralmente usados para outras atividades, como ler notícias, acessar redes sociais, etc. Se usarem o telefone para controlar o veículo, teriam que ficar com o aplicativo do veículo aberto, para controlar o destino, mudar a rota, ver o mapa, etc.
- Os usuários também comentaram que não gostariam de ter que ficar com o telefone na mão enquanto observam os detalhes da viagem. Olhar para uma tela dentro do veículo seria melhor, já que o tablet era dedicado apenas a esta atividade e tinha o mapa aberto a todo o tempo.
O artigo apresentado na conferência também apresenta recomendações para o design dos dispositivos e interfaces para o controle de veículos autônomos. Estes dispositivos possuem o potencial de melhorar a interação do usuário com veículos autônomos do futuro.
Referência:
Oliveira, L., Luton, J., Iyer, S., Burns, C., Mouzakitis, A., Jennings, P., Birrell, S.: Evaluating How Interfaces Influence the User Interaction with Fully Autonomous Vehicles. In: Proceedings of the 10th International Conference on Automotive User Interfaces and Interactive Vehicular Applications – AutomotiveUI ’18. pp. 320–331. ACM Press, New York, New York, USA (2018) https://doi.org/10.1145/3239060.3239065